Sustainable Development Outlook 2019: Gathering storms and silver linings

De Física Computacional
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Em 2019 a Organização das Nações Unidas publicou um relatório discutindo o panorama do desenvolvimento sustentável. O que vou trazer são pequenas discussões sobre determinados trechos. O relatório como um todo tem 4 capítulos, e não devo abordar todos. O primeiro que é o de maior interesse para meu trabalho aborda questões econômicas e a desigualdade como um todo. O segundo discute outros obstáculos para que o desenvolvimento sustentável seja atingido, especialmente mudanças climáticas, conflitos e deslocamento de populações, o terceiro é voltado ao uso de novas tecnologias para atingir os objetivos. E por fim, o último busca discutir algumas propostas de política pública, como políticas de taxa de carbono, impostos, e renda básica universal.

Resumo Executivo

Começamos com o "resumo executivo", e como sempre, focado principalmente nas questões econômicas. Vale lembrar que neste momento,este texto é principalmente constituído de notas de estudo. Começamos então lembrando que os objetivos de desenvolvimento sustentável foram concebidos na agenda de desenvolvimento sustentável 2030, e são consideradas, nas palavras do relatório, as maiores esperanças para um futuro sustentável. Porém tem surgido desafios na sua implementação e o relatório visa então trazer para o debate público algumas destas questões. Uma das questões centrais quando se debate desigualdade de riqueza é, afinal, qual é o problema de existir desigualdade que faz necessário que seja combatida? Temos então uma resposta dada logo no início do relatório, que foge um pouco da dimensão econômica e entra na dimensão política:

 “A persistência de altos níveis de desigualdade enraíza a incerteza e a insegurança entre as pessoas, reforçando as divisões e minando a confiança nas instituições e no governo.”

Essa é uma ideia que vai reaparecer mais adiante. Além disso, discutindo os próprios objetivos definidos na agenda 2030, o aumento da desigualdade econômica é uma séria ameaça à ao desenvolvimento sustentável desenhado pela mesma. Discutindo brevemente alguns tópicos, temos algumas observações interessantes que acredito que valem a pena serem trazidos para cá.

O relatório sinaliza que o comércio internacional é um mecanismo de crescimento global que tem diminuído o ritmo desde a crise financeira em 2008. O que teria como consequência o enfraquecimento da geração de empregos e a piora na desigualdade entre os países, assim como o incremento do senso de incerteza e insegurança, aumentando então o risco de uma crise econômica.

Porém, além do crescimento global medido muitas vezes em termos de PIB, é importante que a comunidade internacional olhe além desta quantidade para que seja possível de se alcançar os objetivos. O aumento no PIB não reflete necessariamente uma melhora no bem estar da população. Ainda que exista uma tendência de crescimento da riqueza global, há no mundo um índice persistente e elevado de inseguridade no emprego: a maior parte da população está engajada em empregos informais e em condições de vulnerabilidade. É urgente então que se crie um número adequado de trabalhos que ofereçam salário digno e benefício para que os objetivos sejam alcançáveis.

Em 2019, um a cada três adultos enfrentava riscos crônicos de desemprego. Governos devem então criar e/ou adotar novas métricas para medir índices da performance econômica do país que meça a criação de empregos dignos, a insegurança econômica e a vulnerabilidade. Desta forma será possível mensurar melhor o combate a desigualdade. Desigualdade esta, que é necessária que seja reduzida em todas as formas e manifestações, a agenda 2030 abraçou como princípio lema “não deixar ninguém para trás”.

Infelizmente, esta é uma batalha em que há poucas evidências que o mundo esteja vencendo, pelo contrário. Nas palavras do relatório, nos últimos anos durante as tentativas de implementação dos objetivos:

 “Os altos níveis de desigualdade de renda e riqueza observados na maioria dos países surgiram como o maior obstáculo para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.”

É necessário aqui, então retomar a importância de combater a desigualdade. Ela é responsável por impedir o desenvolvimento sustentável em muitas formas. O aumento na desigualdade de riquezas e acesso de oportunidades desencoraja o acúmulo de habilidades, sufoca a economia e a mobilidade social, além de frear o desenvolvimento humano. A desigualdade consolida a incerteza, vulnerabilidade e insegurança, mina a confiança nas instituições e no governo, aumenta a discórdia e a tensão social. Quando há um incremento na desigualdade de uma sociedade, ela se torna mais suscetível a violência e episódios de conflito.

Para combater é necessário agir em todas dimensões. Existe uma dinâmica de reforço entre desigualdade e insegurança no emprego que aprisiona grande parte da população em sociedades altamente desiguais. O combate a este mecanismo deve fundamentar as decisões políticas, deve-se então expandir as possibilidades educacionais, criar trabalhos decentes e fortalecer as medidas de proteção social. É necessário uma nova aproximação da redistribuição de riqueza, renda e oportunidades. Conflitos violentos frequentemente são resultados de um alto índice de desigualdade entre grupos e insegurança domiciliar, de forma que também é prioritário além da expansão das oportunidades econômicas a garantia do domicílio de qualidade, especialmente para os grupos mais marginalizados e vulneráveis.


Desigualdade, incerteza e insegurança econômica

Crescimento: o crescimento econômico sem políticas públicas sustentáveis não leva a um progresso sustentável, porém a vitalidade da economia é crucial para que seja possível atingir as metas. A estagnação do crescimento da economia e do comércio internacional ameaça reverter os ganhos que o mundo teve nas últimas épocas.

O BRICS tem ocupado uma posição cada vez mais importante na economia mundial, enquanto a relevância do seleto grupo de países mais ricos tem decaído proporcionalmente, isso denota uma mudança na dinâmica global.

Tensão: O aumento na desigualdade de riqueza e de renda tem gerado um sentimento "anticomercial", nas palavras do relatório. Desde a crise de 2008, em média 800 novas medidas protetivas foram introduzidas anualmente, com destaque para o conflito entre EUA e China.

Além disso, é dito que pesquisas econômicas apontam um alto custo da guerra de tarifas para o PIB do mundo, além de que as tensões ao mesmo tempo que criam oportunidades para outros países, tem como efeito final na economia global um efeito negativo devido principalmente ao alto custo de ajuste e transição para uma nova dinâmica. Como um todo, essa situação indica um enfraquecimento do sistema atual.

Incertezas: Esse é um dos tópicos mais importantes. É necessário que sejam adotadas políticas públicas que promovam trabalho de qualidade, e não apenas quantidade. Essa é uma medida crítica para combater a desigualdade e insegurança econômica. Na maior parte dos países o crescimento dos salários não acompanhou o crescimento da produtividade, dentre outros motivos, podemos destacar a ausência de políticas públicas proativas neste sentido. Enquanto o salário permaneceu estagnado para os 50% na base da pirâmide, ela cresceu substancialmente para o topo da pirâmide (os 10% mais ricos). Ao mesmo tempo, o custo de vida aumentou como um todo. Também se faz necessário políticas de proteção econômica para pessoas de idade avançada.

Hoje, no mundo, 61% da força de trabalho está em situação informal, parcial ou contratual. Nos EUA, 40% dos trabalhadores estão em situação de insegurança financeira, 25% em moderada e 15% em alta. É também conhecido que a insegurança financeira influencia nas eleições, estimulando a votação na extrema direita, e também nos índices de imigração, fazendo com que as pessoas migrem em busca de maior qualidade de vida.

Dívidas: Aqui eu chamo a atenção que países europeus frequentemente tem dívida acima de 100% do PIB, e ainda temos o caso extremo do Japão onde essa dívida ultrapassa 200%. O relatório sugere que os países façam empréstimos em moedas locais para fugir da valorização do dólar. A crise de dívidas nacionais em todo mundo denuncia também uma falta de coordenação global para responder a esta crise, é necessário então uma melhor infraestrutura financeira global, dada a inabilidade das instituições e ferramentas que existem para lidar com este problema.

Desigualdade: Mais de dois terços do mundo está experimentando um crescimento na desigualdade de renda e de riqueza, o que se torna um obstáculo para que seja possível alcançar um desenvolvimento sustentável.

Aqui eu preciso abrir espaço para tecer um comentário pessoal. Em um primeiro momento é dito que desigualdade é associada a um desvio da meritocracia e equidade, assim como ela seria um requisito moral em diferentes culturas e contextos. Na sequência então temos a apresentação de que estudos indicam que não há correlação entre alta desigualdade e crescimento lento, o que indicaria que não é necessário desigualdade para o crescimento econômico. Eu estou de acordo com a ideia de que não é necessário desigualdade para o adequado desenvolvimento socioeconômico de uma sociedade, mas a primeira afirmação é quase que redundante: não há igualdade, porque há desigualdade. A questão aqui, na minha opinião, é entender a causa da desigualdade e o que é necessário mudar para que essa igualdade econômica seja atingida.

Vulnerabilidade: Se por um lado, altos níveis de empregos informais e vulneráveis reforçam a desigualdade, por outro lado, um alto índice de desigualdade também estimula o aumento de trabalhos informais e vulneráveis. A hipótese levantada para explicar esta situação consiste na ideia de que uma alta concentração de riqueza também se traduz em uma alta concentração de poder político, o que permite que os mais ricos conseguem impor sobre a sociedade políticas públicas que sejam de seu agrado, o que leva a uma menor densidade de sindicatos e proteção social.

Ascensão social:A alta desigualdade econômica está intimamente relacionada com baixa mobilidade social, isto é, a mobilidade de salário entre gerações é menor quando a desigualdade é alta. Uma das razões disso acontecer são as limitações financeiras que famílias mais pobres possuem para investir na educação dos seus filhos.

Além disso, conforme discutido anteriormente, a concentração de poder que ocorre no topo da pirâmide permite que o processo de decisão de políticas públicas adotado pelo governo não leve em conta e não satisfaça as necessidades da população que está fora desse estrato social. Existe uma narrativa que de desigualdade faria o público apoiar políticas que não favorecem o desenvolvimento econômico da sociedade, mas o que é observado é que uma maior desigualdade econômica se traduz em uma desigualdade de poder político, de forma que a concentração de riqueza se traduz também na concentração de poder político, tirando o poder político da mão do público. Pesquisas indicam que nos EUA, o serviço público prefere agradar os mais ricos do que a maior parte da população.

A frequentemente apontada queda da desigualdade entre os países é devido em grande parte, a enorme população dos países asiáticos em desenvolvimento. O a desigualdade no interior dos países medida pelo Gini aumentou nos países que abrigam mais de 2/3 da população mundial. Estes resultados já havíamos observado no relatório anterior, inclusive contestando a interpretação de que a desigualdade estava a diminuir, e como podemos ver na sequência, adiantamos grande parte da discussão que estamos vendo agora.

O relatório continua a discussão trazendo à tona a situação de que muitos países, apesar de apresentarem uma queda no Gini, ainda apresentaram um aumento na concentração de riqueza da fatia dos 10% mais ricos. De maneira geral, mesmo em países que apresentaram uma queda na desigualdade em diferentes índices, o crescimento do salário e a criação de empregos de qualidade não tem sido rápido o suficiente para que as pessoas na parte debaixo do espectro consigam escapar da pobreza.

Outra observação interessante é que os maiores índices de desigualdade estão associados a menor densidade de sindicatos e políticas públicas de proteção do trabalhador. Isso ocorre, pois conforme temos discutido incessantemente, estas políticas públicas não são de interesse de quem está no topo da pirâmide. Por fim, existe a observação de que crises financeiras afetam diferentemente a desigualdade de riqueza e de renda.

Enquanto a parte mais pobre não não sofre necessariamente a maior perda proporcional do salário, pois está blindada pelos mesmos motivos que a prendem nessa situação (o relatório destaca o isolamento geográfico e baixa conectividade ao mercado nacional e global), a classe média é quem sofre desproporcionalmente, enquanto a classe alta normalmente está mais preparada com antecedência para lidar com a crise, além de inclusive receber compensação financeira pelos bancos. Quando falamos sobre desigualdade de riqueza, a crise faz o preço das casas colapsar, afetando fortemente a população mais pobre da população, enquanto a rápida recuperação do mercado financeiro beneficia os ricos. O relatório sugere então uma possibilidade de desacoplamento entre as desigualdades de riqueza e de renda.

Acredito que isso dê no máximo em uma curta janela temporal. Enquanto a renda do pobre permanece igual e o patrimônio diminui na crise, o rico tanto se prepara e recebe compensação financeira para não sentir uma queda significativa na renda quanto tem seu patrimônio valorizado. Precisaria fazer uma análise melhor, mas acredito que a longo prazo, o que acontece é apenas o aumento da desigualdade tanto de riqueza quanto de patrimônio, no máximo temos uma oscilação imediatamente após a crise.

Neste ponto, acho importante discutir o que é considerado trabalho vulnerável. Segundo o sindicato britânico UNISON são trabalhos que requerem baixa qualificação, pagam mal e possuem pouca segurança no emprego. Os trabalhadores são constantemente explorados e forçados a trabalhar por longas horas, ou em condições de perigo. Trabalhadores vulneráveis também talvez não saibam de seus direitos trabalhistas ou tenham medo de desafiar seus empregadores quando tratados de forma injusta.

Desafio: A redução da desigualdade é algo que tem permanecido como um desafio ao longo do tempo, mas não é o suficiente reduzir apenas as desigualdades econômicas, mas todas as manifestações de desigualdades: de acesso à educação, proteção social, água limpa e saneamento básico, tecnologia, terra, recursos naturais, etc ...

Conforme já discutido, um estado de alta desigualdade econômica anda lado a lado com a alta concentração de poder político. Buscando proteger os próprios interesses, estes com influência política tem então o incentivo para ativamente impedir a introdução de medidas de redução da desigualdade, criando efetivamente uma armadilha de desigualdade.

O reconhecimento destas armadilhas aumenta a urgência da tarefa de combater a desigualdade, iniquidade e exclusão. Algo que me chama a atenção no relatório é a sugestão de um movimento migratório "ordenado e regular", como uma medida importante para reduzir a desigualdade, prevenir conflitos e facilitar o combate às mudanças climáticas.

O relatório nos lembra que a globalização do comércio tem sido frequentemente acusada como fator chave no crescimento da desigualdade, seja em países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Porém, há uma falta de evidências empíricas que suportem essa ideia. Existiriam então dados cruzados entre países cobrindo as últimas décadas que mostram uma correlação limitada entre a abertura de comércio e a desigualdade no interior do próprio país. Estudos recentes apontaram que ainda que a abertura tenha uma posição significativa na desigualdade de renda, seu impacto seria secundário frente a outros fatores, como o desenvolvimento tecnológico, a abertura financeira (que diz respeito ao fluxo financeiro internacional), e a profundidade financeira (o desenvolvimento dos sistemas financeiros nacionais). O maior responsável então, seriam políticas públicas ruins, como o enfraquecimento do poder de barganha do trabalhador e o desenvolvimento inadequado em áreas como educação e medidas de segurança social, dentre outras.

Na minha perspectiva esse é um assunto que merece um melhor aprofundamento e discussão sobre como abertura comercial ou a globalização do comércio é definida. Na linguagem do dia a dia, abertura comercial se confunde com abertura financeira, além de que segundo os próprios estudos apontados a abertura comercial teria um efeito (ainda que secundário) na desigualdade, e a própria abertura financeira tem um efeito primário. Então antes de formular maiores opiniões, para mim, é necessário um aprofundamento no tópico. Outro ponto pra levantar é que não raras as vezes as medidas de abertura defendidas trazem consigo a exigência ou o incentivo daquilo que é descrito como políticas públicas ruins, como por exemplo, o enfraquecimento do poder de barganha do trabalhador.

De todo modo, o relatório defende que é necessário criar melhores mecanismos de redistribuição para compensar o impacto assimétrico do comércio internacional, minimizando os efeitos prejudiciais do mesmo. O que na minha leitura torna evidente o reconhecimento de que existem efeitos negativos e que esta abertura não pode ser feita de forma desregulada.

Insegurança: É importante entendermos que quando se discute incerteza econômica, o uso do termo 'econômico' diz mais sobre as consequências (prejuízo na renda e/ou patrimônio) do que as causas. Poderíamos ter como fonte de incertezas econômicas, por exemplo, eventos climáticos extremos, mudanças tecnológicas, conflitos violentos, etc. A insegurança não é algo que pode ser capturado facilmente por um indicador, é algo difícil de ser medido objetivamente e faz com que frequentemente as análises ignorem as implicações do mesmo para o desenvolvimento sustentável. Porém a insegurança pode minar a confiança nas instituições e a participação popular, além de ter consequências psicológicas no indivíduos. Por isso é necessário uma demanda de gerenciamento de risco mais integrada, que vá além de respostas pontuais a eventos adversos quando os mesmos se realizam. O fator psicológico exige que os formuladores de política pública vão além da preocupação com maximização de renda e consumo como é tradicional em modelos econômicos tradicionais.

Incerteza: Há dois fatores ligado a incerteza econômica que interagem entre si para moldar a insegurança econômica:

  • O estado e a percepção pública das incertezas econômicas;
  • A habilidade das pessoas gerir estas incertezas.

A própria incerteza vem de diferentes formas: mudanças rápidas e inesperadas, mudanças lentas que são esperadas a ocorrência mas não é possível prever a intensidade, e a volatilidade de variáveis econômicas. Sendo assim, a insegurança econômica não nasce puramente da incerteza, mas ela surge a partir da percepção pública destas incertezas e da capacidade de lidar com as incertezas. Nos últimos tempos a incerteza econômica tem aumentado, o que pode ser observado tanto em termos objetivos como o aprofundamento da crise climática, quanto em termos subjetivos como análises textuais dos relatórios econômicos divulgados na mídia, que funciona como uma representação da percepção pública da incerteza.

Lidando: Conforme discutido anteriormente, o crescimento da incerteza econômica é apenas metade da história da insegurança, se as pessoas se sentem seguras ou não, depende de quão bem as pessoas se sentem preparadas para lidar com as diferentes formas de incerteza. Existem diversos mecanismos que uma pessoa pode recorrer para lidar com incerteza, com destaque para os seguros sociais.

É dado conhecido que países em desenvolvimento tem uma rede de proteção social com uma cobertura muito maior que em países em desenvolvimento. Deixar que a nível individual a capacidade de lidar com incertezas não tem a capacidade de reduzir a insegurança econômica. Entre os países membros da OECD, 40% da população se encontra em situação economicamente vulnerável, isto é, não possuem capital financeiro suficiente para viver mais que 3 meses sem salário e acima da linha da pobreza. Este é um número muito maior que a população que possui uma renda baixa, o que implica que não é um problema restrito à população com baixo rendimento. É fato que a incerteza está crescendo no mundo, e ele não está preparado para lidar com isso.

Desigualdade: A insegurança econômica tem efeito direto nas decisões domiciliares e na economia como um todo. Um cenário de alta insegurança pode levar a um efeito manada, onde cada indivíduo adota uma posição cautelosa que tende a seguir as ações dos outros. Porém os efeitos da desigualdade tem diferentes impactos nos diferentes grupos da população, levando a um agravamento ainda maior da desigualdade. Como exemplo, podemos citar que a resiliência dos domicílios frente aos eventos climáticos depende das condições sócio econômicas de seus residentes. Com um efeito cíclico negativo, a desigualdade por sua vez intensifica o sentimento de insegurança.

Outro exemplo de como a insegurança aprofunda a desigualdade pode ser vista sob a perspectiva do desempenho cognitivo. Exercícios em laboratório demonstram que as pessoas têm diferentes níveis de performance dependendo da distância entre o que precisam fazer e os recursos disponíveis para que façam isto. Quanto mais as duas coisas estão distantes entre si, mais essa questão captura a atenção do indivíduo, gerando pensamentos intrusivos e atrapalhando sua performance. Dessa forma, quem enfrenta situações de insegurança econômica (que é tipicamente a população menos favorecida) encara uma espécie de 'imposto cognitivo' que além de afetar sua produtividade, afeta principalmente seu bem estar.

Confiança: O aumento da insegurança tem como efeito colateral a queda da confiança pública no governo, instituições e até mesmo entre indivíduos. Esse é um cenário que favorece a votação em candidatos fora do considerado ‘mainstream’, tipicamente populistas e nacionalistas. Pode também fazer com que a população se sinta menos comprometida em seguir regras, o que afeta negativamente a eficiência de políticas públicas.

A diferença entre o que o panorama chama de elite e trabalhadores regulares, que ocorre a nível nacional também tem sido projetado na esfera internacional. As forças nacionais capitalizaram o descontentamento nacional projetando a culpa nas instituições. Porém é real que de forma geral, o sistema de comércio internacional está em crise, por exemplo, a evasão de impostos reflete um controle internacional inadequado.

Se as potências não se esforçarem para corrigir os problemas no sistema multilateral, melhorar a cooperação internacional sobre impostos, facilitar a transferência de tecnologia, lidar com a crise climática, entre outras questões, então países menos desenvolvidos vão ficar para trás, sendo a população mais vulnerável destes países suportando o peso das consequências.

O relatório também traz uma breve discussão de blockchain, como uma aproximação descentralizada para lidar com questões financeiras, onde contratos inteligentes eliminam a necessidade de instituições centralizadas liberarem as transações. Mas é preciso lembrar que ainda existe uma relação de confiança entre os usuários e a tecnologia que estão adotando, assim como as instituições que operam essa tecnologia. Seria então essa uma tecnologia que pode facilitar transações econômicas, mas isso depende da confiança na eficiência do sistema.

Ninguém fica: Alguns números chamam a atenção nessa parte. Para países de baixa e média-baixa renda, é necessário passar de 3.5% para 6.3% do PIB o investimento em educação para atingir a educação universal (do nível pré-primário até o secundário). É necessário também em torno de 4.2% do PIB destes mesmos países para atingir uma proteção social necessária, isto é, uma proteção social universal que cobre transferência de dinheiro para crianças, benefício de maternidade, auxílio para deficientes e aposentadoria, dentre outros. Em média, é necessário 7.5% do PIB dos países para assegurar os objetivos relativos à saúde, onde dentre outros subitens, destaca-se a cobertura universal de saúde.

Temos aqui menos de 20% do PIB necessário, em média. Além disso, quando se discute as metas relativas a água e saneamento básico, é necessário 0.39% do PIB agregado dos 140 países estudados, com um pouco mais a ser destinado para os países em desenvolvimento.

Investimento: Alguns países conseguem utilizar recursos domésticos para atender as necessidades, outros podem precisar de financiamento internacional. Para aumentar as receitas, os países devem então focar em recuperar recursos perdidos através de atividades como sonegação de impostos e fluxo financeiro ilícito. Este último diz respeito a movimentos de dinheiro ou capital de um país ou outro, em que alguma parte desse processo, seja a transferência ou a origem do dinheiro, é ilícita. Como exemplo podemos citar corrupção, tráfico, trabalho escravo, etc…

Na África mais dinheiro é perdido neste fluxo ilegal do que entra diretamente através de investimentos estrangeiros. Mais alguns dados que são trazidos é que em países de baixa renda nos anos recentes programas de proteção social tem sido mais esvaziados do que educação, saúde e nutrição. Além disso, os países da Ásia e Pacífico precisam investir apenas mais 4% do PIB total da área para acabar com a extrema pobreza nos próximos anos e caminharem na direção da saúde pública e educação de qualidade. A ênfase do investimento varia entre as regiões, no sul da Ásia o foco deve ser proteção social, saúde e educação, enquanto o leste deve se concentrar em questões ambientais.

Conclusão

O fim do capítulo traz algo que se aproxima a um resumo de tudo que foi visto destacando que o deveria ser visto como as discussões mais importantes que foram feitas. Começamos então retomando a discussão sobre incerteza e insegurança econômica. Devido a sua importância, aqueles responsáveis por criar as políticas públicas devem ser cuidadosos na forma com que se comunicam com o público para evitar aumentar a insegurança econômica de forma desnecessária.

O aumento da desigualdade econômica é algo que não se encerra em si mesmo, mas também paralisa as ações contra a crise climática, e serve como combustível para uma crescente onda de nacionalismo e populismo. Agora é bastante interessante notar que entre os anos 1990 e os finais dos anos 2000, houve um aumento expressivo do apoio público a favor da redistribuição de renda. Em 70% dos países pesquisados a população se tornou mais favorável à redistribuição, sendo algo mais expressivo ainda em países que tiveram o maior aumento de desigualdade. Porém essa vontade pública não se materializou em políticas públicas devido a concentração de poder político nas mãos da fatia da população mais rica nestes países.

O relatório avança com uma discussão sobre a importância de "redefinir a distribuição", segundo o mesmo "ela não significa menos para as pessoas no topo". O argumento é que "significa mais para todo mundo: mais paz e estabilidade para as pessoas no topo, mais segurança econômica e oportunidades para as pessoas na base", além de uma condição mais sustentável para enfrentar a crise climática.

Discutindo algumas alternativas mais específicas que podem contribuir no combate a desigualdade, o relatório se concentra basicamente em imposto como forma de coletar recursos e então políticas sociais redistributivas para distribuir estes recursos. É mencionado a importância do imposto progressivo como um fator importante no combate a desigualdade, assim como sobre ganhos de capital e herança para diminuir a desigualdade entre as gerações. Políticas fiscais também contribuíram para uma diminuição na desigualdade de renda, aumentado a oferta e o acesso a serviços básicos que apoiam todos os cidadãos, mas os mais pobres em particular.

Porém o que se observou nos últimos anos foi um um aumento na desigualdade ao redor do mundo. Isto está relacionado a eliminação de esquemas de imposto progressivo, redução em impostos de renda (especialmente nas rendas mais altas) dentre outras políticas que beneficia o segmento mais rico da sociedade. O relatório também traz uma breve discussão sobre a possibilidade de que reduzir a desigualdade de compra ao invés da renda pudesse ser mais efetivo para reduzir a desigualdade de consumo.

Quanto às políticas sociais redistributivas, as sugestões são incluir benefícios diretamente em dinheiro, como subsídios e ajustes nos impostos, assim como benefícios não-financeiros como saúde e educação. A América Latina é citada como um exemplo bem sucedido onde países implementaram com sucesso programas de transferência de dinheiro. Propostas de uma renda básica universal tem emergido ao redor do mundo. Além disso, a reforma agrária é um importante debate a ser feito em países em desenvolvimento no combate à desigualdade.

Porém a mudança necessária é estrutural, Nas palavras do relatório:

 “Transformações estruturais não são apenas aceitáveis, mas parte integral da estratégia para muitos países em desenvolvimento conseguirem lidar com a desigualdade... O que se sabe é que é necessário uma aproximação proativa dos estados e dos legisladores e que deixar essas grandes ambições pro mercado não leva a esta transformação estrutural necessária.”

Para a elaboração de novas políticas públicas é necessário levar em conta os padrões passados já conhecidos de distribuição durante o crescimento econômico, e não apenas a quantidade de crescimento. É necessário mudarmos o foco de ser 'o país que cresceu mais rápido a economia' para 'o país que mais reduziu a desigualdade'. Além disso, a redução da desigualdade deve ser feita de forma paralela a busca por um desenvolvimento mais sustentável ecologicamente.

Porém os dados não são completamente animadores. Com o que tem sido feito até hoje na maior parte do mundo, está claro que o esforço feito tem sido lamentavelmente inadequado para combater a pobreza e o desenvolvimento sustentável, uma vez que a desigualdade permaneceu basicamente inalterada nos últimos 15 anos até 2015, e nos 15 anos anteriores houve um agravamento desta desigualdade.

Por fim, uma discussão adicional é feita sobre o caso da Etiópia que alcançou resultados expressivos nos últimos anos, e muito se discute sobre as razões do seu sucesso econômico. Segundo o relatório esta transformação da economia etíope é resultado de um planejamento de longo prazo e uma forte vontade política do estado, tudo foi realizado sob a orientação de um "estado desenvolvimentista".


O caminho a seguir

Vamos para o quarto e último capítulo, nesta seção, se discute algumas políticas públicas para lidar com a mudança climática e a desigualdade, sendo que meu foco de interesse está concentrado principalmente nesta última questão. De maneira geral, as propostas se concentram em sistema de impostos (sobre a riqueza e a renda) e renda básica universal, então vou começar passando rapidamente por questões mais gerais.

A primeira coisa que relatório nos lembra, é que por um lado, produtores se preocupam com o seu sucesso imediato e o lucro, frequentemente ignorando os custos sociais e ambientais de suas decisões, e por outro lado, os consumidores são frequentemente limitados a consumir bens e serviços que são oferecidos a preços acessíveis, dessa forma, o atual sistema de produção e consumo é organizado de forma que não leva em conta outros fatores que não são diretamente econômicos, como danos ambientais e sociais.

As campanhas de conscientização são lentas, e desta forma, inadequadas para a escala e urgência dos problemas que precisamos enfrentar, por isso a necessidade da elaboração de políticas públicas eficientes. Na questão ambiental, uma sugestão é o imposto sobre emissão de carbono. Ela se concentra na ideia de que o comportamento humano responde a incentivos financeiros e impostos são incentivos (ou desincentivos) financeiros efetivos, então propõe-se o que é chamado de taxa de carbono. Porém essa é uma medida que ainda encontra bastante resistência, caindo em um dilema análogo ao conhecido dilema do prisioneiro da teoria de jogos, há pesquisas que investigam a questão sob essa perspectiva.

De forma breve, também discute-se a importância de acordos globais que tratem sobre o tema, não apenas a Agenda 2030, mas também o Acordo de Paris e a Agenda de Ação Adis Abeba. Um esforço global citado como importante para construir uma infraestrutura resiliente e diminuir a desigualdade, assim como também combater a crise climática é a Nova Rota da Seda.

Imposto progressivo: Entrando então na discussão mais específica sobre as políticas públicas que dizem respeito diretamente a desigualdade econômica, nos é lembrado que durante a maior parte do século XX os países adotaram imposto progressivo (isto é, quanto maior a renda, maior o imposto) para garantir uma redistribuição mais equitativa ao mesmo tempo que oferece um bom serviço público.

Porém, nos últimas 4 décadas a situação começou a mudar. Seguindo o argumento de que os impostos baixos encorajam o investimento privado e gera um efeito multiplicador maior que o investimento público, e fazendo uso da concentração de poder adquirida através da concentração de riqueza, as pessoas de alta renda conseguiram exercer uma influência política forçando a queda da progressividade fiscal.

Eu vou abrir espaço para lembrar que a revolução russa que deu origem à União das Repúblicas Soviéticas (URSS) ocorreu no começo do século XX, e o fim da URSS aconteceu 3 décadas atrás. Sei que existem alguns pensadores que sugerem um impacto da URSS na política de países capitalistas. Buscando combater a propagação das ideias socialistas e comunistas, os países se viram obrigados a adotarem políticas favoráveis aos trabalhadores como forma de amenizar as tensões sociais e garantir a sobrevivência do capitalismo. Com o fim da URSS essa situação pode ter se modificado. Me parece que podemos estar observando aqui este mesmo efeito. Agora a correlação não significa causa, precisaria um estudo mais aprofundado para confirmar ou descartar esta hipótese.

Economias altamente informais, com uma fraca administração de impostos aliado com uma alta concentração de poder político dos ricos tem muitas vezes prevenido a adoção com sucesso de impostos progressivos. O que muitos países desenvolvidos têm adotado é aumentar os impostos indiretos em valor agregado (Value added tax, VAT), um imposto sobre consumo.

Com a queda na arrecadação de impostos, os governos têm se deparado com o desafio de procurar novas fontes de recursos para financiar o serviço público e reduzir a desigualdade, especialmente a desigualdade de consumo e acesso de oportunidades. Segundo o relatório, políticas de proteção social e de transferência podem reduzir a desigualdade no consumo mesmo quando a desigualdade é alta. Segundo o relatório, nos EUA, mesmo com uma queda no imposto progressivo, a desigualdade no consumo não se aprofundou tanto por causa dos programas sociais de transferência. Em cada domicílio nos EUA 30% do consumo costuma ser consumo sem dinheiro, principalmente pagamentos por cuidados de saúde.

Eu particularmente me mantenho cético sobre estas afirmações. Eu gostaria de um maior aprofundamento. Gostaria de entender melhor como se daria essa significativa redução na desigualdade de consumo sem reduzir desigualdade de renda ou riqueza. Lendo superficialmente, não me parece ser uma redução nem que se sustente, e nem o suficiente para alcançar os objetivos propostos pela própria agenda 2030. Pois, por exemplo, mantém intocada a questão da concentração de poder.

Imposto sobre riqueza: Segundo o relatório o imposto sobre propriedade não mitiga diretamente a desigualdade nem de renda e nem de riqueza, mas é a principal fonte de renda para financiar a educação e questões ligadas à segurança pública nos EUA, algo similar ocorre em outros países em desenvolvimento. Em contrapartida, é algo pouco aproveitado em países em desenvolvimento.

Já o imposto sobre riqueza que incide sobre todos ativos reais e financeiros está crescendo em popularidade. Porém, apesar de não deixar claro, acredito que é uma popularidade entre a população. Pois segundo o próprio relatório, menos países adotavam essa forma de tributação em 2017 (apenas 7 países dos membros da OECD) do que nos anos anteriores. Os críticos apontam que tem pouco ganho quando comparado com os custos administrativos, uma vez que é um imposto que poderia facilmente ser evitado ou reduzido através de deduções legais, escondendo os ativos ou os movendo para outros países, e isso levou a eliminação do imposto em alguns países.

A minha perspectiva pessoal é que esta crítica não discute apropriadamente os pontos relevantes, que é o impacto no combate a desigualdade. Me parece mais fruto da pressão política das classes mais altas para diminuir a tributação sobre suas riquezas. Estes problemas indicados, ainda que eu reconheça que existam, me parece que são questões que podem e devem ser solucionadas através do desenvolvimento de políticas públicas mais eficientes, uso de tecnologias modernas e robustas e cooperação internacional. Não concordo com a ideia de que a fatia mais rica da população procurar por meios legais e ilegais de fugir dos impostos seja um boa justificativa para abolir esta forma de imposto.

Por fim, ainda há uma discussão sobre o imposto sobre terra. Este é o imposto considerado mais eficiente de todos, que encontra boa aceitação tanto entre a esquerda quanto entre a direita, apesar disso, continua sendo uma novidade para a maior parte dos países. Seu conceito é bastante simples: uma quantidade significativa da riqueza é capturada no valor das terras em centros urbanos, o valor desta terra aumenta principalmente devido aos investimentos públicos na região e a própria localização do terreno, dessa forma ações individuais do dono da terra não aumentam o valor da mesma. O imposto visa taxar este aumento no valor da terra que é devido ao investimento público, e desta forma 'imerecido' pelo dono da terra.

Podemos pensar então que as políticas públicas pensadas pelo relatório para o combate da desigualdade tem dois momentos: um primeiro de captação de riqueza e um segundo de redistribuição dessa riqueza. Para a captura, o mecanismo proposto é basicamente imposto, ainda que diferentes tipos de impostos. Neste capítulo foi discutido de forma resumida:

  • Imposto sobre renda: o imposto progressivo sobre renda seria uma das propostas mais interessantes para um desenvolvimento sustentável, algo que tem sido enfraquecido na maioria dos países.
  • Imposto sobre consumo: a alternativa que os países em desenvolvimento têm adotado, principalmente o VAT (value added tax)
  • Imposto sobre riqueza: Podemos abrir a discussão em três novos tópicos:


  • Imposto sobre propriedade: contribui diretamente mais para financiar o estado do que combate a desigualdade de riqueza ou renda, mas desta forma permite que o estado tenha recursos para implementar políticas públicas.
  • Imposto sobre a riqueza total: aplicado em poucos países, com a justificativa da dificuldade de implementação.
  • Imposto sobre terra: considerado o melhor imposto de todos, porém ainda uma novidade para a maior parte dos países.


Eu quero adicionar uma discussão sobre o imposto sobre consumo, pois apesar do relatório apontar como uma medida para diminuir a desigualdade no consumo, tenho dificuldade de enxergar essa forma de tributação como efetiva no combate a desigualdade. A agência Senado em 2021, por exemplo, publicou um texto discutindo porque a fórmula de cobrança de impostos do Brasil piora a desigualdade social.

Vale uma citação:

 “ Os tributos servem para custear tanto a máquina estatal quanto os serviços públicos, como saúde, educação e segurança. De forma geral, eles incidem sobre três bases: o consumo, a renda e o patrimônio dos cidadãos e das empresas. Em todos os três pilares, existem distorções que beneficiam os ricos e penalizam os pobres.”

Discutindo especificamente o imposto sobre o consumo, é dito: “A tributação do consumo é aquela embutida no preço de produtos e serviços. Como os tributos incidentes sobre determinada mercadoria são iguais para qualquer consumidor, quem ganha pouco, na comparação com quem ganha muito, acaba perdendo um pedaço maior da sua renda com esses tributos na hora da compra.”

Segundo o texto, a solução seria ter tributo variável conforme poder aquisitivo do comprador, o que é reconhecidamente como inviável. Outra opção que penso seria tributar apenas o consumo daquilo que é consumido preferencialmente pelos ricos, e talvez a proposta da ONU seja algo neste sentido, mas me parece ter uma complexidade maior de implementação e uma ineficiência menor do que imposto sobre a renda. A título de curiosidade, o imposto sobre consumo responde a 43% da arrecadação nacional no Brasil em 2021, a média nos países da OCDE é 33%, sendo 23.5% no Canadá e 17.5% nos EUA.

Continuando essa discussão, em 1966 o país parou de tributar sócios e acionistas que recebem lucros e dividendos de empresas. E apesar de ter uma espécie de tributação progressiva, a alíquota máxima é 27.5% e era atingida por alguém que recebesse apenas R$4.665. A tributação sobre grandes fortunas é prevista na constituição mas não havia saído do papel até 2021.

Se fosse tributado patrimônios superiores a R$20 milhões, teria 30 mil contribuintes e a arrecadação seria o suficiente para pagar o bolsa família por mais de um ano. Há ainda mais distorções mas acredito que é o suficiente, quem tiver mais interesse eu recomendo ler o texto completo.

Por fim, o último tópico discute a renda básica universal, que diz respeito sobre o segundo momento: a redistribuição da riqueza arrecadada anteriormente, principalmente através dos impostos. A renda básica universal é uma ideia que existe no mínimo desde o fim do século 18 mas obteve um renascimento no século 21. Ele é definido como um programa que pague a todo indivíduo (independente de qualquer critério) uma quantidade de dinheiro suficiente para suprir as necessidades básicas de todo cidadão.

Por um lado, os proponentes defendem que essa política permite que os indivíduos se neguem a aceitar trabalhos indignos, aumentando o poder de negociação dos trabalhadores dentre outros benefícios. Já os opositores defendem que ela fornece um incentivo negativo, como por exemplo, desencorajar as pessoas a buscarem trabalho.

Pessoalmente eu vejo essa crítica como não muito aprofundada, algo que vemos no Brasil pelos críticos do Bolsa Família, mesmo que isso não tenha nenhuma evidência empírica. Porém é necessário pontuar que a efetividade de um programa dessa magnitude depende de como ele dialoga com um sistema de bem-estar da população mais amplo. Como complementar a outras políticas públicas pode ter um efeito positivo diminuindo a desigualdade, porém como um substituto pode ter um efeito inverso de acentuar a desigualdade.

Para concluir, pode-se destacar que o maior desafio para financiar a RBU (renda básica universal)diz respeito aos recursos necessários, porém a sua eficiência tem sido posta a teste em um teste piloto entre 2017 e 2018 na Finlândia. Os resultados preliminares dizem que não houve efeito nos níveis de desemprego e aumentou a condição física e mental das pessoas, assim como sua confiança nas instituições.


Fonte:

  • [1] Sustainable Development Outlook 2019: Gathering storms and silver linings
  • [2] Por que a fórmula de cobrança de impostos do Brasil piora a desigualdade social