Modelo de Ising: mudanças entre as edições

De Física Computacional
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'''Evolução do Sistema:'''
'''Evolução do Sistema Ferromagnético:'''


Agora podemos avaliar um aspecto qualitativo relacionado à forma como a rede evolui durante a simulação. Estamos considerando duas redes iniciadas aleatoriamente, porém com distribuições de spins <math>+1</math> diferentes, sendo avaliadas em duas temperaturas arbitrárias com ordens de grandeza distintas.
Agora podemos avaliar um aspecto qualitativo relacionado à forma como a rede evolui durante a simulação. Estamos considerando duas redes iniciadas aleatoriamente, porém com distribuições de spins <math>+1</math> diferentes, sendo avaliadas em duas temperaturas arbitrárias com ordens de grandeza distintas.

Edição das 07h37min de 22 de fevereiro de 2024

Autores: André Guimarães, Filssen Schereiber, João Roth e Lucas Oliveira

Este trabalho tem como objetivo estudar o Modelo de Ising em uma e duas dimensões, com interações com primeiros e segundos vizinhos. Para essa finalidade, foram utilizados conhecimentos dos métodos de Monte Carlo, principalmente o algoritmo de Metropolis.

Introdução

O modelo de Ising surgiu na década de 1920 como uma simplificação do modelo de Heisenberg. Inicialmente desenvolvido para compreender o ferromagnetismo, passou, ao longo dos tempo, a ser aplicado em diversas áreas interdisciplinares, tais como biologia, neurociência, dinâmica social e economia, devido a sua simplicidade.

Este é, provavelmente, o modelo mais comumente estudado na mecânica estatística. É possível dizer que o modelo de Ising é, para a mecânica estatística, o que a mosca-da-fruta é para a genética. O modelo possibilita ilustrar o conceito essencial de como o equilíbrio entre energia e entropia conduz a uma mudança de fase. (falta a referência)

Foram realizados diversos estudos sobre matemática, física e as potenciais aplicações desse modelo. Neste trabalho, pretendemos explorar alguns aspectos fundamentais e os resultados possíveis de serem obtidos por meio de simulações de Monte Carlo em sistemas magnéticos com diversas dimensionalidades.

Problema com o modelo de Heisenberg

Em 1924, Wilhelm Lenz delegou a seu aluno de graduação Ernst Ising a tarefa de compreender e resolver o modelo de Heisenberg para o ferromagnetismo. Heisenberg propõe um modelo de rede que busca explicar o ferromagnetismo em sólidos a partir da energia de interação entre os spins. Por exemplo, podemos considerar uma rede quadrada com contornos periódicos onde os elétrons do sólido são distribuídos uniformemente. Dessa forma, podemos descrever a energia resultante da interação entre quaisquer dois elétrons como:


(1)

Na equação acima, representa uma constante de troca que denota a intensidade da interação entre dois spins vizinhos. Caso os spins não sejam vizinhos, esse coeficiente de interação é nulo. Além disso, os vetores e representam os momentos magnéticos. Portanto, através do produto escalar, a energia depende da projeção de um momento magnético em relação ao outro: será se estiverem alinhados e se estiverem em sentidos contrários.

Vale ressaltar que o coeficiente J é positivo, o que implica em contribuições negativas na energia quando os vetores momento magnético são paralelos, devido ao sinal negativo da expressão. Por conseguinte, para spins antiparalelos, observa-se um aumento na energia. Como esperado, o sistema tende a permanecer no estado de menor energia. Assim, os spins do sistema tendem a se alinhar, como é característico de uma fase ferromagnética.

Esse sistema tem um Hamiltoniano da forma:


(2)

Na expressão, os símbolos de bra-ket são usados para representar a soma sobre os primeiros vizinhos. Contudo, desse sistema, temos uma função de partição da forma:


(3)

Essa expressão representa o somatório de todas as configurações da exponencial da energia de cada configuração dividida pela constante de Boltzmann e pela temperatura.

Nesse momento, Ising se deparou com um problema, pois, além de possuir poucos recursos matemáticos na época, o número de configurações é infinito, uma vez que é possível observar qualquer direção entre os vetores momento magnético de forma contínua.

Modelo de Ising

Ising resolveu o problema das infinitas configurações assumindo que, ao invés de lidar com spins que rotacionam 360 graus nas três coordenadas espaciais, ele selecionaria uma coordenada e consideraria a projeção dos spins nela. Na prática, ele conseguiu reduzir o problema de infinitas configurações para apenas duas: ou o spin aponta para o sentido positivo do eixo, ou para o sentido negativo.

Dessa forma, o uso do produto escalar para os vetores de momento magnético não é mais necessário, uma vez que esses agora assumem valores entre e . Assim, podemos escrever o Hamiltoniano como:


(4)

Com essas considerações, torna-se possível descrever a transição de fase entre ferromagnetismo e paramagnetismo em sistemas ao menos bidimensionais.

Além disso, podemos introduzir um termo no Hamiltoniano responsável por descrever o sistema na presença de um campo magnético externo:


(5)

onde H é um coeficiente relacionado ao campo magnético externo. O acréscimo desse termo faz com que o estado de menor energia seja aquele favorável à direção desse campo.

Para o estudo da transição de fase magnética definimos uma grandeza chamada de magnetização. Essa grandeza é responsável para computar a média de todos os spins do sistema e, nesse caso, será o parâmetro de ordem. Seja o número de spins do sistema, escrevemos a magnetização como:


(6)

ou ainda, é possível expressarmos a magnetização em função do número de spins para cima ou para baixo :


(7)

Com essa notação, é possível observar um comportamento característico da magnetização. A magnetização será próxima de zero quando os números de spins para cima e para baixo forem próximos, ou seja, quando o sistema está em um estado de alta desordem. Por outro lado, para valores do módulo da magnetização próximos da unidade, temos um sistema bem ordenado, com praticamente todos os spins paralelos entre si.

Esse comportamento, conforme esperado do parâmetro de ordem, auxilia na distinção clara da transição de fase de um estado ordenado para um estado desordenado. Tal visualização pode ser realizada fixando alguns parâmetros físicos do sistema e analisando o comportamento da magnetização em relação à temperatura ou ao campo externo, por exemplo.

Implementação

Algoritmo de Metrópolis

O algoritmo de Metrópolis em Monte Carlo é uma técnica fundamental em simulações computacionais, amplamente utilizada em física estatística, química computacional, ciência dos materiais e várias outras áreas. Ele é utilizado para amostragem de configurações de um sistema físico ou químico de acordo com a sua distribuição de probabilidade, mesmo quando essa distribuição é desconhecida ou difícil de calcular diretamente.


Algoritmo de Metrópolis para o modelo de Ising:

  • 1) Inicialização: Começamos com uma configuração inicial do sistema. Nesse caso, iniciamos uma rede de spins aleatoriamente desemparelhados;
  • 2) Proposição de uma Mudança: Uma nova configuração do sistema é proposta. Isso pode ser feito mudando a configuração de um spin aleatório da rede;
  • 3) Avaliação da Aceitação da Mudança: Avaliamos a probabilidade de aceitar a nova configuração proposta. Se a nova configuração for mais provável do que a configuração atual, ela será aceita automaticamente. Caso contrário, a aceitação será baseada em uma probabilidade determinada pela relação entre as probabilidades das duas configurações, de acordo com a condição de balanceamento detalhado:

(8)

  • 4) Atualização do Sistema: Se a mudança for aceita, o sistema é atualizado com a nova configuração. Caso contrário, o sistema permanece no estado atual.
  • 5) Repetição: Repetimos os passos 2-4 por um grande número de iterações ou até que o sistema atinja o equilíbrio termodinâmico.

O aspecto crucial do algoritmo de Metrópolis é a garantia de que, à medida que o número de iterações tende ao infinito, a distribuição de configurações amostradas converge para a distribuição de equilíbrio do sistema.

É válido notar que, em nossa primeira análise, avaliamos as energias de cada estado conforme a equação (4), na qual há interação apenas entre primeiros vizinhos.

Algoritmo de Metrópolis para Segundos Vizinhos

Com o objetivo de implementar interações de segundos vizinhos ao modelo de Ising é necessário modificá-lo levemente, transformando a equação (5) na seguinte equação:

(9)

Onde o índice j indica os primeiros vizinhos do índice i, enquanto os índices k indicam os segundos vizinhos do mesmo. A partir dessa simples alteração é possível gerar comportamentos distintos, de acordo com a relação entre os parâmetros e .

O algoritmo de Metropolis garante que o modelo de Ising leve em conta a temperatura mas ainda tenda ao seu estado de menor energia. Para tal um spin aleatório da malha sofre um "flip", ou seja, seu valor é multiplicado por . Com essa modificação na malha, a energia é calculada e comparada à energia antes da modificação. Caso a variação seja negativa a alteração é aceita; mas se for positiva só será aceita com uma probabilidade de . Isso garante que altas temperaturas permitam mais alterações positivas, gerando mais ruído.

No entanto, a fim de simplificar computacionalmente a conta, o é calculado diretamente utilizando a seguinte equação:

(10)

Sendo i o índice do spin sorteado a ser invertido. Nota-se que é possível determinar o próximo passo para o sistema sem mesmo calcular sua energia ou modificá-lo, basta utilizar a equação (10) e os critérios do algoritmo de Metropolis.

Resultados

Malha Unidimensional

Inicialmente, aplicamos o algoritmo descrito na seção anterior a um sistema linear com spins. O sistema é inicializado aleatoriamente de acordo com as proporções descritas nos gráficos de energia por passo da simulação e magnetização por passo da simulação.


Energia:

Energida do sistema por passo de Monte Carlo para diferentes configurações iniciais: (75/25) 75% da rede é aleatoriamente ; (50/50) 50% da rede é aleatoriamente ; (25/75) 25% da rede é aleatoriamente .

A energia pode oscilar enquanto o sistema busca alcançar o equilíbrio térmico. Essas flutuações iniciais são esperadas à medida que os spins interagem e se reorganizam para alcançar uma configuração de menor energia. Após um período inicial de termalização, espera-se que a energia média do sistema se estabilize em torno de um valor constante. Isso indica que o sistema alcançou um estado estacionário ou de equilíbrio, onde as flutuações na energia são mínimas ao longo do tempo. Mesmo após a estabilização, pequenas flutuações na energia podem ocorrer devido a mudanças locais na configuração dos spins. A forma e a amplitude das flutuações na energia podem depender da temperatura do sistema. Temperaturas mais altas tendem a resultar em maiores flutuações de energia devido à maior agitação térmica, enquanto temperaturas mais baixas podem produzir flutuações menores à medida que o sistema se aproxima do estado fundamental de menor energia.


Magnetização:

Magnetização do sistema por passo de Monte Carlo para diferentes configurações iniciais: (75/25) 75% da rede é aleatoriamente ; (50/50) 50% da rede é aleatoriamente ; (25/75) 25% da rede é aleatoriamente .

Inicialmente, a magnetização pode flutuar consideravelmente à medida que o sistema se ajusta para alcançar o equilíbrio termodinâmico. Essas flutuações representam o processo de relaxamento do sistema até que ele atinja um estado estável. Após um período inicial de equilibração, a magnetização tende a estabilizar-se em torno de um valor médio. Esse valor médio reflete a magnetização do sistema no estado de equilíbrio termodinâmico.

No modelo de Ising unidimensional (1D), não ocorre uma verdadeira transição de fase ferromagnética com uma temperatura crítica finita, como acontece em dimensões mais altas, como no modelo de Ising bidimensional (2D) ou tridimensional (3D). Isso ocorre devido a uma propriedade matemática conhecida como a "desigualdade de Mermin-Wagner". No entanto, isso não significa que não ocorram mudanças significativas no comportamento do sistema ao variar a temperatura. Em um modelo de Ising 1D, você ainda pode observar uma mudança nas propriedades magnéticas do sistema à medida que a temperatura é variada. Por exemplo, a magnetização média pode diminuir à medida que a temperatura aumenta devido às flutuações térmicas, e o comportamento das flutuações magnéticas pode ser alterado de forma significativa.

Malha Bidimensional

Interações de Primeiros Vizinhos

Analogamente ao caso de uma dimensão, avaliamos os gráficos de energia e magnetização em função de dos passos da simulação.


Energia:

Energida do sistema por passo de Monte Carlo para diferentes configurações iniciais: (75/25) 75% da rede é aleatoriamente ; (50/50) 50% da rede é aleatoriamente ; (25/75) 25% da rede é aleatoriamente .


Magnetização:

Magnetização do sistema por passo de Monte Carlo para diferentes configurações iniciais: (75/25) 75% da rede é aleatoriamente ; (50/50) 50% da rede é aleatoriamente ; (25/75) 25% da rede é aleatoriamente .


Evolução do Sistema Ferromagnético:

Agora podemos avaliar um aspecto qualitativo relacionado à forma como a rede evolui durante a simulação. Estamos considerando duas redes iniciadas aleatoriamente, porém com distribuições de spins diferentes, sendo avaliadas em duas temperaturas arbitrárias com ordens de grandeza distintas.

Evolução da rede de spins com proporções iniciais iguais entre os estados dos spins. No gráfico à esquerda, observa-se a evolução da rede em alta temperatura, enquanto no gráfico à direita, acompanhamos a evolução da rede em baixa temperatura.
Evolução da rede de spins onde 75% da rede é aleatoriamente . No gráfico à esquerda, observa-se a evolução da rede em alta temperatura, enquanto no gráfico à direita, acompanhamos a evolução da rede em baixa temperatura.

É possível observar que as características iniciais da rede pouco se mantiveram, sendo o fator predominante a ordem do sistema relativo à temperatura. Para temperaturas ainda mais baixas, chegamos em um estado de equilíbrio do sistema totalmente ordenado.

A evolução da rede de spins com proporções iniciais iguais entre os estados dos spins em baixa temperatura, com equilíbrio em fase totalmente ordenada.

Interações de Segundos Vizinhos

Diversos casos foram estudados a fim de encontrar semelhanças e diferenças em seus comportamentos. O primeiro caso estudado apresenta correlação exata entre e , ou seja, ambos iguais a 1. O segundo caso apresenta uma interação fraca e contrária para segundos vizinhos, ou seja e . O terceiro caso demonstra uma interação mais forte (mas ainda contrária) para segundos vizinhos, ou seja, e . Por fim o quarto caso exemplifica uma situação instável, onde e . Todos os casos partem da mesma condição inicial, onde 75% da malha se encontra com spin positivo e 25% com spin negativo.

Primeiro Caso

Evolução temporal para , , e .
Evolução temporal da magnetização para , , e
Relação entre temperatura e magnetização de equilíbrio para , e
Evolução temporal da energia para , , e

O primeiro caso apresenta as mesmas características que o modelo de primeiros vizinhos, sua única diferença está na intensidade da correlação local que é aumentada significativamente. Isso faz com que a malha atinja o equilíbrio de forma mais rápida, mas também faz com que a temperatura necessária para uma troca de fase aumente drasticamente.

É importante relembrar pela equação (8) que o número de segundos vizinhos é bem maior do que primeiros vizinhos, o que faz com que tenha um papel muito mais importante na dinâmica do sistema do que .


Segundo Caso

Evolução temporal para , , e .
Evolução temporal da energia para , , e
Evolução temporal da magnetização para , , e
Relação entre temperatura e magnetização de equilíbrio para , e

O segundo caso apresenta características bem distintas do modelo de primeiros vizinhos, mas a principal é que seu estado de equilíbrio depende muito da temperatura escolhida. O modelo de primeiros vizinhos apresenta uma troca de fase para altas temperaturas, onde o sistema é tomado por ruídos que tornam a malha paramagnética. Aqui isso também ocorre, mas existe uma segunda troca de fase para temperaturas muito baixas. Isso ocorre pois a falta de ruído permite que a fraca interação de segundos vizinhos se manifeste, criando falhas na malha que não permitem a malha se alinhar completamente. Já em temperaturas intermediárias, o ruído gerado é capaz de desfazer as falhas da malha, permitindo que ela atinja um alinhamento completo. Outra alteração importante pode ser vista na transição de fase para altas temperaturas: a temperatura crítica diminuiu ligeiramente.


Terceiro Caso

Evolução temporal para , , e .
Evolução temporal da energia para , , e
Evolução temporal da magnetização para , , e
Relação entre temperatura e magnetização de equilíbrio para , e

O terceiro caso apresenta características próximas do segundo, mas sua maior intensidade para interações de segundos vizinhos lhe dá características únicas. A principal característica se apresenta em baixas temperaturas que não mais possuem fase ferromagnética, as falhas na malha são muito numerosas e impedem seu alinhamento. No entanto é possível notar que ainda existe uma transição de fases, mesmo que em temperaturas muito mais baixas. Essa transição ocorre entre dois estados paramagnéticos, um causado por falhas naturais e estáveis da malha, e outro causado por ruído aleatório e inconstante gerado pela temperatura.


Quarto Caso

Evolução temporal para , , e .
Evolução temporal da energia para , , e
Evolução temporal da magnetização para , , e
Relação entre temperatura e magnetização de equilíbrio para , e

Este caso demonstra um material com baixa interação magnética com campos externos, um material que naturalmente procura estados de magnetização nula. No entanto, a interação negativa de segundos vizinhos impossibilita que a malha atinja uma estado estático, pois vários estados de equilíbrio são apresentados para uma mesma energia. É importante ressaltar que o estado não possui mais uma mudança de fase já que naturalmente apresenta magnetização próxima de zero; mas o aumento de temperatura aumenta em muito seu ruído, alterando sua energia de equilíbrio.