Grupo: André Luis Della Valentina, Lucas dos Santos Assmann, Vinícius Bayne Müller
Introdução
A equação de Dirac descreve uma partícula relativística de spin
, como o elétron, com estrutura análoga a da equação de Schrödinger. Ela surgiu inicialmente como tentativa de explicar discrepâncias entre experimentos e teoria para o espectro do átomo de hidrogênio, possibilitando correções para o cálculo da energia do elétron em diferentes níveis (as chamadas correções de estrutura fina). Além disso, por meio dela foi possível prever a existência de antimatéria: descrevendo o elétron, ela também descreve o pósitron.
A fim de compatibilizar a Mecânica Quântica com a Relatividade Especial, a equação diferencial parcial é de primeira ordem tanto no tempo quanto no espaço (diferentemente da equação de Schrödinger, que é de segunda ordem no espaço). A equação de Dirac pode ser escrita de diversas formas; aqui, apresentamo-la explicitamente como um sistema de EDPs acopladas, mais conveniente para os propósitos do trabalho.
Assim como a equação de Schrödinger, a construção da equação de Dirac vem a partir do operador Hamiltoniano, que descreve a evolução temporal do estado quântico em questão:
onde, como anteriormente, os autovalores de
correspondem aos valores possíveis de energia que o sistema pode assumir.
A mudança com relação à Mecânica Quântica não relativística acontece quando consideramos a energia relativística da partícula:
Assim, o Hamiltoniano é modificado para representar a medida da energia relativística total.
Diferentemente da equação de Schrödinger, aqui
não representa apenas uma função de onda, mas sim um conjunto de quatro delas. Usando a notação
,
as componentes de
representam as funções de onda associadas ao elétron e ao pósitron:
(
) representa a função de onda do elétron com spin up (down), e
(
) representa a função de onda do pósitron com spin up (down). O objeto
é chamado de spinor.
Dedução da equação de Dirac em duas dimensões
Consideraremos neste trabalho a equação de Dirac em duas dimensões,
e
. A escolha dessas coordenadas se dá pela conveniência do acoplamento das EDPs: nesse caso, as quatro equações acopladas passam a ser acopladas duas a duas, facilitando o estudo do sistema.
Construção do Hamiltoniano completo
Consideremos uma partícula sob ação de um potencial
(onde
), que afeta a energia potencial da partícula, e de um potencial "escalar"
, que afeta a massa de repouso da mesma. Seguindo uma das propostas possíveis para o Hamiltoniano, temos
onde
;
e
são matrizes 4x4 adimensionais e
é o vetor momento linear da partícula.
Pode-se mostrar que
e
devem satisfazer certos vínculos, limitando as escolhas possíveis para essas matrizes. A escolha mais simples e usualmente adotada consiste em tomar
Sendo
, podemos escrever o produto escalar
como
Portanto, em notação matricial o Hamiltoniano
pode ser escrito como
Unidades naturais e redução para duas dimensões
A fim de simplificar o formalismo, adotamos as chamadas "unidades naturais", onde
. Note que isso equivale a reescalar as quantidades físicas do problema por um fator adequado. Ao fazer
, também assumimos que a partícula está no limite relativístico.
Além disso, queremos estudar o problema em duas dimensões. Observamos que
; logo,
. Portanto, temos o Hamiltoniano simplificado
Forma explícita final
Retornando ao problema original, queremos resolver
Novamente utilizando a notação matricial, obtemos
Realizando a multiplicação matricial, pode-se ver que se obtém dois sistemas acoplados:
com
e
com
. Escolhendo o sistema de
com
:
Simplificando e isolando a derivada temporal, obtemos por fim
Discretização
A equação de Dirac 1D pode ser escrita, na forma matricial, como:
Onde
e
é matriz identidade de dimensão 2.\\
Para discretizar uma equação diferencial parcial como essa, é necessário discretizar o espaço e o tempo. Convenciona-se
como um passo finito de tempo e
como um passo finito no espaço, de tal forma que
, onde
são números inteiros. Define-se a notação
e também
. Discretiza-se as derivadas parciais explicitamente com uma expansão em série de taylor da própria função:
Considerando uma derivada discretizada
e truncando na primeira ordem:
O processo é completamente análogo para a derivada espacial, porém para facilitar a aplicação do método mantém-se o espaço centrado em
, em outras palavras faz-se uma expansão em torno de
, obtendo:
Com isso, obtém-se uma equação para um método explícito no tempo da equação de Dirac 1D.
Pode-se também desenvolver um método implícito no tempo fazendo a expansão de
em torno de
, obtendo:
Ao aplicar esta aproximação na equação discretizada basta dar um passo a frente em todos os elementos, obtendo um método implícito no tempo, já que há dependência com
.
Método de Crank-Nicholson
O método de Crank-Nicholson(CN) consiste em uma média entre um método explícito e outro implícito no espaço. Utilizará-se a notação
para representar justamente a média entre ambos os métodos, ou seja:
Define-se a notação:
Dessa maneira, enuncia-se o método CN para a equação de Dirac 1D como:
Onde
são as discretizações explícitas das derivadas.
Para que seja possível aplicar e estudar o método é necessário passar da notação matricial para escalar:
Isolando cada tempo em um lado da igualdade:
Abrindo as matrizes
e
, e operando-as sobre o vetor
na equação tem-se:
Pode-se realizar as operações matriciais e escrever duas equações escalares. Para facilitar notação utilizará-se
e
:
Falhou ao verificar gramática (Erro de conversão. Servidor ("https://wikimedia.org/api/rest_") reportou: "Cannot get mml. TeX parse error: Bracket argument to \\ must be a dimension"): {\displaystyle {\begin{cases}[1+{\frac {i\Delta t}{2}}(V_{j}^{n+1}+1)]f_{j}^{n+1}+{\frac {\Delta t}{4h}}(g_{j+1}^{n+1}-g_{j-1}^{n+1})=[1-{\frac {i\Delta t}{2}}(V_{j}^{n}+1)]f_{j}^{n}-{\frac {\Delta t}{4h}}(g_{j+1}^{n}-g_{j-1}^{n})\\[1+{\frac {i\Delta t}{2}}(V_{j}^{n+1}-1)]g_{j}^{n+1}+{\frac {\Delta t}{4h}}(f_{j+1}^{n+1}-f_{j-1}^{n+1})=[1-{\frac {i\Delta t}{2}}(V_{j}^{n}-1)]g_{j}^{n}-{\frac {\Delta t}{4h}}(f_{j+1}^{n}-f_{j-1}^{n})\\\end{cases}}}
Tem-se então um número
de equações onde
é o número de elementos do espaço discretizado. Portanto o primeiro termo das duas equações gera uma matriz diagonal pois multiplica os termos espaciais dependentes de
, já o segundo termo gera uma matriz tridiagonal com diagonal principal nula. Nota-se que os primeiros termos dos dois lados da igualdade são um o conjugado do outro, define-se, portanto,
e
.
Considerando que o potencial V é só função da posição, escreve-se o método como:
Onde:
Por fim, pode-se escrever o método resolvendo o sistema:
Onde
.
Com isso, condições iniciais e de contorno bem estabelecidas, já é possível aplicar o método, dado que todas essas matrizes dependem somente dos parâmetros do sistema.
Estabilidade Crank-Nicholson
Utilizará-se o método de Von-Neumann para analisar a estabilidade do método para a equação de Dirac unidimensional, para supõe-se que a função $\mathbf{\Phi^{n} _j}$ pode ser dada pela série de fourier:
Devido à indepêndencia linear de cada termo do somatório, ao substituir na equação do método haverá uma equação para cada ente do somatório. Se o módulo da razão $\frac{\mathbf{A}^{n+1}}{\mathbf{A}^{n}} \le 1$ então é pode-se dizer que o método estável, já que dessa forma garante-se uma não divergência.
Aplica-se um termo geral da série de índice $k$ no método CN para a equação de dirac 1D.
Divide-se tudo por
e isola-se
:
Nota-se que os termos que multiplicam o fator
são o conjugado um do outro, define-se
, dessa maneira:
Onde
é sempre diferente de zero, dado que a parte real é dada por uma matriz identidade constante.
Mostra-se, portanto, que a razão entre os coeficientes da série de fourier nunca divergem, ou seja, o método é incondicionalmente estável.
Referências
- The quantum theory of the electron. Proceedings of the Royal Society of London A, v. 117, n. 778, p. 610–624, fev. 1928.
- SAKURAI, J. J. Mecânica quântica moderna. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012.
- BAO, W. et al. Numerical Methods and Comparison for the Dirac Equation in the Nonrelativistic Limit Regime. Journal of Scientific Computing, v. 71, n. 3, p. 1094–1134, jun. 2017.
- SOFF, G. et al. Solution of the Dirac Equation for Scalar Potentials and its Implications in Atomic Physics. Zeitschrift für Naturforschung A, v. 28, n. 9, p. 1389–1396, 1 set. 1973.
- THALLER, B. The Dirac equation. Berlin: Springer, 2010.